A busca por eficiência operacional nas empresas é legítima, necessária e, muitas vezes, determinante para a competitividade. Em um cenário de crescente pressão por redução de custos e aumento de produtividade, os canais digitais de atendimento ao consumidor, especialmente os chatbots, surgiram como
A busca por eficiência operacional nas empresas é legítima, necessária e, muitas vezes, determinante para a competitividade. Em um cenário de crescente pressão por redução de custos e aumento de produtividade, os canais digitais de atendimento ao consumidor, especialmente os chatbots, surgiram como aliados valiosos. Eles oferecem escalabilidade, disponibilidade 24 horas por dia e capacidade de resolver um grande volume de demandas de forma rápida e objetiva.
Quando bem calibrados, os assistentes virtuais contribuem não apenas para reduzir o tempo de resposta, mas também para melhorar a experiência do consumidor em pontos de contato de baixa complexidade, liberando as equipes humanas para casos que exigem análise mais apurada. Mas é justamente na calibragem, ou na falta dela, que mora um dos maiores riscos jurídicos da era da automação.
A linha tênue entre eficiência e litigiosidade
A expansão do atendimento automatizado, se não for acompanhada de uma governança jurídica efetiva, pode transformar a solução tecnológica em uma fonte inesperada de passivos judiciais. O que inicialmente se apresenta como uma ferramenta de redução de custos pode, na prática, gerar um novo tipo de contencioso: o contencioso digital.
O problema não está; na tecnologia em si, mas na forma como ela é projetada, alimentada e monitorada. Fluxos mal desenhados, respostas genéricas e ausência de trilhas claras para solução de problemas são fatores que, na prática, acabam violando direitos básicos do consumidor, como o direito à; informação clara, à solução efetiva da demanda e ao acesso facilitado a canais humanos. No caso de empresas reguladas, como as dos setores financeiro, telecomunicações e saúde suplementar, ainda há; a exigência legal de cumprimento das normas da Lei do SAC.
O resultado é um aumento perceptível nas reclamações administrativas, nas denúncias aos Procons e na judicialização de temas que poderiam, e deveriam, ter sido resolvidos na origem.
O papel estratégico do Jurídico e de Legal Operations na gestão do SAC digital
O desafio, portanto, não é frear a transformação digital do atendimento, mas integrá;-la de forma responsável e juridicamente sustentável. Nesse contexto, o departamento jurídico e as á;reas de Legal Operations têm; um papel central na construção de um SAC automatizado que seja ao mesmo tempo eficiente e seguro. Algumas ações se tornam indispensá;veis:
- Auditoria jurídica dos fluxos de atendimento: revisão periódica dos roteiros do chatbot para garantir que estejam alinhados ao Código de Defesa do Consumidor e, quando aplicá;vel, às exigências da Lei do SAC. A atuação deve envolver uma aná;lise minuciosa das respostas padrão, trilhas de atendimento e procedimentos de escalonamento.
- Monitoramento contínuo de riscos de judicialização: acompanhamento de indicadores como taxa de resolução no primeiro contato, reincidência de demandas e aumento de processos com origem no SAC digital. Legal Ops pode contribuir diretamente ao estruturar painéis de controle e dashboards que permitam visualizar esses riscos em tempo real.
- Integração com á;reas de CX, TI e Compliance: o jurídico não pode atuar isoladamente. A governança do chatbot exige um trabalho conjunto com os times de Customer Experience, Tecnologia da Informação e Compliance, assegurando que as decisões técnicas e operacionais considerem os impactos legais.
- Implantação de trilhas de escalonamento automá;tico: identificação de palavras-chave de risco, como menções a Procon, Justiça ou mídia, que acionem de forma imediata o redirecionamento para atendimento humano especializado.
- Gestão proativa de base de conhecimento: Legal Ops pode ajudar a criar fluxos de validação jurídica para as respostas padrão do chatbot, evitando que conceitos imprecisos ou informações incompletas sejam disseminados aos consumidores.
- Aná;lise periódica de causas-raiz das demandas judiciais: estabelecer um ciclo de feedback entre contencioso e atendimento digital, para que as principais causas de judicialização sejam corrigidas diretamente nos fluxos automatizados.
Automação com responsabilidade: o caminho possível e desejá;vel
O avanço dos canais digitais de atendimento é irreversível. Chatbots bem estruturados são, sem dúvida, uma ferramenta poderosa para melhorar a experiência do cliente, reduzir custos e agilizar a resolução de problemas. Mas, para que cumpram esse papel, precisam operar dentro dos limites legais, com responsabilidade, transparência e mecanismos efetivos de correção.
O jurídico, junto com Legal Ops e á;reas de CX, tem a oportunidade e a responsabilidade de transformar o SAC digital em um ativo estratégico de proteção institucional. Ignorar esse papel significa abrir espaço para o crescimento de um passivo invisível, que só; se revela quando os processos começ;am a chegar. A tecnologia pode acelerar o atendimento, mas é; a governança jurídica que garante que essa velocidade não resulte em colisões com o consumidor e com o Judiciá;rio.